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Mais um episódio da ET Family: "Banhada: e não é que a senhora zen tinha razão?"

Como já disse milhentas vezes, a minha vida dava um filme de comédia. Nada, mas mesmo nada, nesta casa corre normalmente do princípio ao fim.

Lembram-se que na passada quarentena um simples passeio - um dos únicos que decidimos dar - correu tão mas tão bem que acabou com o carro atolado no meio do nada?

Então vamos lá a mais um episódio da série ET Family...

Um dia destes, o estado emocional cá de casa era de tal forma que eu, eu mesma que cumpro escrupulosamente as regras do confinamento, sugeri. Vamos por os meninos no carro e vamos dar uma volta. Vamos até um sítio com natureza, sem ninguém e deixamos os putos correr. Já não se aguenta tanta birra, tanta energia acumulada e direccionada para o disparate. "E se nos mandarem parar?" perguntava o meu marido preocupado. "Se nos mandarem parar, explicamos que desde Março de 2020 que nunca falhamos e que, portanto, por amor à Santa da Sanidade Mental nos deixem ir não para nenhuma festa, não para nenhum espaço clandestinamente aberto, mas para o meio do mato!".

E fomos. Estava a fazer-se tarde e, por isso, não fomos ao mato, fomos à praia. A uma praia que adoramos no Oeste. Estacionamos o carro no parque e percebemos que a escolha tinha sido perfeita. Estava vazia... vazia de todo. Os miúdos estavam histéricos, a Maria gritava feliz, o Miguel batia palminhas ansioso por saltar do carro para fora!

Quando estávamos prestes a chegar à boca da rampa que dá acesso ao areal, onde entretanto a Maria Leonor já corria desalmadamente feliz de um lado para o outro, fazendo pinos e rodas, deparámo-nos com uma mãe que passeava uma menina. A única alminha viva por ali. A menina deveria ter aproximadamente 2 anitos e, por isso, assim que lhe pôs a vista em cima, o Miguel Maria teve uma reacção estrondosa. Começou a falar, ao de longe, a dançar, rodopiando sobre si mesmo contente por ver alguém do seu tamanho, batia palminhas feliz, enfim. Comovente... eles precisam de socializar, ponto final.

A mãe, mais velha que eu, de máscara posta na cara, percebeu a minha preocupação e acabou por começar a conversar connosco. Educadamente, manteve-se a bem mais de 3m de distância, sempre de máscara posta, e foi (ela e nós) divagando um pouco sobre o que para ela é estar a viver tudo isto.

Descemos a rampa até à areia. Os meninos estavam por ali, longe do mar, a brincar. O Pedro estava por perto, a brincar com o Miguel. A mais sossegada era, indubitavelmente, a filha desta senhora, que permanecia sempre a uma curta distância da mãe, sem grandes aventuras.

Enquanto a senhora falava, apercebi-me que a Maria Leonor estava a puxar as calças para cima, arregaçando-as fervorosamente. Mas estava de meias. E comecei a ficar preocupada. Aquela praia tem uma particularidade que é: o mar é longe, mas a praia faz uma espécie de baía, de ria que entra areia a dentro e se estende até ...

Ela dançava como uma bailarina junto à beira da água, desejosa de se enfiar lá dentro. E eu, percebendo isso, interrompi a conversa da senhora para lhe gritar "Maria, atenção, não tenho roupa no carro!". E a senhora intervinha, explicando que é lindo as crianças serem livres, brincarem, sujarem-se, arriscarem, e terem experiências memoráveis. E nisto, a Maria Leonor entra dentro de água de meias. Pronto, nada havia mais a fazer. Molhou-se até aos tornozelos, podia ter sido pior, pensei eu em breves segundos, enquanto sorria e mantinha a compostura junto da senhora que me dizia tudo aquilo.

E a senhora continuava, a chamar-me à atenção para a beleza de ter uma família assim, linda, livre, a brincar. E era... a Maria de meias dentro de água, o Pedro e o Miguel a brincar mais ao lado, o pôr-do-sol ao fundo. Perfeito. Um bálsamo para a minha alma triste da publicação anterior a esta.

E foi quando, ao som daquela conversa lírica, vejo o Miguel Maria aproximar-se da irmã, de calças e ténis. "Sim, são lindos os meus filhos, tão felizes, olha..." dizia eu nervosíssima, a tentar interiorizar que tudo aquilo não iria correr mal e que, de facto, eu era e sou uma felizarda. E zás! Já estás! Miguel dentro de água com a irmã de ténis e tudo. Claro que a água que dava pelos tornozelos da Maria Leonor, chegava à vontade às canelas do Miguel Maria. "Ohhhh, tão felizes que estão, olha tão giro, estas são lembranças para sempre" dizia a senhora claramente num estado de evolução mental e espiritual diferente do meu. 

E como se não bastasse, eis senão quando surge o Pedro, de calças arregaçadas até aos joelhos, meias e ténis, a correr que nem um doido, e pumba, dentro de água com eles. Eu juro por Deus que pensei que eles, eles os três, tinham fumado uma antes de sair do carro!!! Mas o que raio está um adulto de 43 anos a fazer dentro de água calçado com duas crianças, no meio do Inverno, no meio de uma pandemia, no meio de um passeio que era para descontrair, no meio de eu não ter roupa para ninguém no carro pá?????

Foi então que percebi que o meu marido não era maluco, mas tentava apenas salvar os filhos. Ele tinha reparado mais cedo que eu numa onda que vinha na direcção na baía e dos miúdos. E enquanto ao longe a senhora continuava a dizer-me para eu aproveitar o momento, a explicar-e o quão bonito era tudo aquilo, eu fiquei de boca aberta a observar o quadro como que em câmara lenta. 

Ora, a Maria, assim que percebeu que era uma onda, oh pernas, deu de frosques, literalmente, deixando tudo para trás! O Pedro ainda tentou incentivar o Miguel a correr, mas ele tem apenas 21 meses e estava mais numa de permanecer ali a brincar e a chapinhar... não, o Pedro não teve outro remédio, que não pegar numa mão do Miguel e levantá-lo assim mesmo, pendurado como um macaco em miniatura, e correr, fugir da onda!

Obviamente que o Miguel vinha pendurado a rir, o Pedro ia tropeçando pela areia mole, e eu, ali parada a ver aquilo, ouvindo, ainda, ao longe, resquícios da conversa da senhora zen, vi o Pedro passar-me ao lado com o seu macaco de peluche e levei com a onda. Fiquei ensopada, enterrada na areia e molhada até às ancas.... mas de onde saiu a onda caramba?? Estávamos na ria.... não há ondas ali raios me partam! 

Olho para trás, vejo a Maria a rir lá longe, a salvo, o Pedro a olhar para os pés, mas sem o Miguel pela mão. E num ápice entrei em estado de alerta por não ver o meu filho. Lá estava ele, a um passo de mim, deitado no chão, aflito, já sem rir e com uma cara de poucos amigos, a levar com a onda... ensopado até às orelhas.

Peguei nele o mais rapidamente que pude e, como sabia que ele vestia um casaco fofo de pêlo que absorveria toda a água, apertei-o instintivamente contra o meu peito para espremê-lo. Não, não pensei simplesmente em tirar-lhe a porra do casaco, não! Eu quis apenas salvar o meu bebé e aconchegá-lo no peito... sim, obviamente que eu fiquei a escorrer não até às ancas, mas até ao pescoço. 

Olhei para o Pedro com o meu olhar El Matador, e levantei a voz: "largaste o meu filho no mar é isso?". Creio ainda ter ouvido a senhora a dizer sorridente e calmíssima (eu também estaria se tivesse uma filha sentada ao meu lado a brincar com umas gramas de areia tranquilamente) qualquer coisa do estilo "oh não, deve ter caído, coitado do seu marido". Mas não deu... repeti: "tu largaste o Miguel???????". E ele explicou que, ao trazê-lo pela mão pendurado, o menino estrebuchava para voltar e ele sentiu o pulso do bebé a torcer. Teve medo de lhe partir o braço e largou sim!

Em resumo. Temos um pai molhado até às canelas, com ténis e meias ensopados, uma menina de 8 anos a rir às gargalhadas ensopada até aos joelhos, um bebé de 21 meses pronto para ser todo despido, e uma mãe, com t-shirt, casaco, calças, meias e sapatos alagados em água. Despedimo-nos da senhora rapidamente e rumamos em direcção ao carro. "Tens roupa?" perguntava o Pedro a caminho. 

Eu sabia que não... e juro que fui aqueles escassos metros a ouvir o meu filho a bater o dente e a pensar no que faria a seguir com tudo fechado, sem roupa e a cerca de 30km de casa... raios me partam mais às minhas ideias de espairecer. Desconfinar é perigoso. Cá está a prova disso!!! Bolas!

Abri a mala da carrinha, sentei o Miguel na mala, tirei-lhe o casaco, a camisola... ficou de body. Saquei-lhe rapidamente os sapatos dos pés, meias, e procurei avidamente por uma muda de roupa qualquer. E dou de caras com as mochilas da escola do Miguel que nunca cheguei a levar para casa! E mais outra do Verão que andou sempre connosco. Abri-as, esperançosa e sim! Sim!!!! Eu sou uma mãe incrível!! Uma muda para cada um! Who's the best???? Me!!!! 

Não importa, não quero saber se a muda da Maria eram uns corsários de Verão e um top de alsas.... e se a muda do Miguel era para 12 meses!!

Pareciam dois saloinhos os meus bebés, mas secos e vestidinhos. Já eu e o pai...

Restou-nos passar no Mac Drive mais próximo - sim, critiquem-me, quero que se lixe! Eu queria era dar-lhes alguma coisa que já passava das 19h! - comprar-lhes uns panadinhos de frango, umas batatas fritas e uma maçã. Foi vê-los em silêncio, felizes da vida, com mudas de roupa alucinantes, depois de uma montanha russa maluca com os pais, como sempre, a comer satifeitos. 

E não é que a senhora zen tinha razão?

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